Caros leitores, nos encontramos de novo após um período longo, admito e neste encontro irei abordar um assunto que é cada vez mais recorrente na imprensa especializada. PMC – Private Military Company, Empresa Militar Privada, no Brasil conhecidas como Empresas Militares e de Segurança Privada – EMSP, o que será que fazem, como atuam, são legais? Vamos tentar por luz a todas estas questões.
Então sigamos em frente.
Um Breve Retrospecto Histórico
O emprego de mercenários em conflitos armados remonta à 401 a.C., ou seja, a cerca de 2.421 anos atrás, quando o então príncipe Persa Cyrus contratou dez mil mercenários gregos para tomar o trono da Pérsia de seu irmão Arsaces.
A palavra mercenário vem do latim “merces” que significa salário ou taxa, assim podemos, literalmente, dizer que todos aqueles que trabalham por salários são mercenários. Mas este termo foi ligado ao longo dos tempos ao soldado profissional ou a alguém que é contratado por entidade política para lutar em um conflito que pode ser uma guerra, uma tentativa de golpe governamental ou uma campanha de ataque ao comércio de drogas.
Historicamente, um mercenário era um soldado contratado para serviço em exército de um país estrangeiro. Por exemplo, na Guerra Revolucionária, a Grã-Bretanha contratou alemães para lutar contra os americanos colonos. Desta mesma forma o exército continental sob comando de George Washington, também empregou mercenários que lutaram ao lado da milícia colonial e dos soldados do exército. Aqui cabe definir que mercenários são soldados profissionais contratados pelo Estado ou Nação pagos quando empregados; milícia é força militar composta de civis que não são pagos quando empregados, bem diferente da definição nos dias de hoje, não é, e exército é o conjunto de militares de carreira de um país que permanece ativo mesmo em tempos de paz e são pagos de maneira contínua pelo ente estatal.
Em uma das três alterações da Convenção de Genebra, o primeiro protocolo de 1977, define claramente que um mercenário é: “especialmente contratado para participar de um conflito, mas não é membro das forças armadas do país que o contratou; ativamente se engaja em hostilidades; é motivado por ganhos privados e ganha muito mais que os militares das forças armadas regulares; não é nacional dos Estados em conflito e não residente de um território controlado pelos Estados envolvidos”. Assim, os mercenários não gozavam da proteção da Convenção de Genebra por não serem um combatente legal.
Em 1989, a Assembleia Geral da ONU aprovou resolução que proibia o uso dos mercenários, no entanto, apenas 30 países ratificaram esta resolução até hoje, os EUA e Iraque, por exemplo, não assinaram este acordo. Após a Segunda Guerra Mundial o uso dos mercenários foi diminuído.
Recentemente o EUA usou em exército de 5.000 “Mercs”, como são chamados os mercenários, fortemente armados para substituir as forças oficiais no Iraque.
Com o fim da Guerra Fria os exércitos permanentes pelo mundo diminuíram, com isto muitos dos conflitos deixaram de ser essencialmente armados, desta forma o aumento do empenho das unidades de inteligência das forças armadas para monitorar a atuação militar do possível inimigo, tomou muito dos recursos de pessoal dos governos que empenharam seus soldados para esta missão e isso poderia trazer sérios problemas de mobilização de tropas em possível ação militar.
Assim as PMC´s proliferaram em 1990, não fornecendo soldados combatentes, mas sim força de trabalho civil para todo e qualquer serviço que não envolvessem combate armado, como por exemplo, monitoramento de sistemas avançados de armas, assistência técnica e apoio logístico, no entanto, alguns servidores de PMC´s entraram em combate.
É obvio, que os conflitos militares, desajustes diplomáticos e outros fatores políticos ou humanitários são benéficos aos negócios das PMC´s, que entre outras coisas ajudam a diminuir o orçamento militar convencional de quem as contratam, uma vez que as operações das PMC´s são mais baratas em todos os aspectos, inclusive o social.
Recentemente a PMC KAS International, que foi fundada por Sir David Stirling, oficial e fundador do grupo de elite inglês SAS, esteve envolvida com a WWF para reduzir a caça ilegal e o contrabando de presas de elefante em vários países da África Austral.
O êxodo de mais de 6 milhões de militares ocidentais na década de 1990 ampliou o campo de recrutamento das PMC´s que puderam contar com mão-de-obra especializada e assim oferecer seus serviços a governos que demandavam deste serviço em curtíssimo prazo.
Especialistas destacam que este êxodo causou desfalque em unidades militares de elite, onde o número de agentes é reduzido. Estes agentes são atraídos pelos altos salários do mercado e quando contratados estavam prontos para atuar de imediato, assim as PMC´s estavam prontas a suprir os desfalques causados nas unidades de elite.
Em 1985, foi criado nos EUA, o LOGCAP, programa de aumento civil e logística que é administrado pelo exército dos EUA para fornecer suporte de contingência para aumentar a estrutura da força do exército.
O primeiro contrato foi fechado 3 anos depois para dar apoio a missão do United States Third Army, a USACE, corpo de engenharia do exército dos EUA que se valeu do LOGCAP para a construção e manutenção de dois sistemas de dutos de petróleo no Sudoeste da Ásia. Em 1992, novamente a parceria entre USACE e LOGCAP apoiou as forças da ONU na Somália, Bósnia, Kosovo, Macedônia, Hungria, Arábia Saudita, Haiti, Itália e Ruanda.
As outras forças armadas dos EUA também criaram programas semelhantes ao LOGCAP para usar PMC´s, a marinha americana criou dois programas o Navy Global Contingency Construction Contract (GCCC) e o Global Contingency Services Contract (GCSC).
Algumas PMC´s serviram como conselheiras e ajudaram a treinar forças armadas locais para que estas atuassem melhor ao invés de interferirem diretamente, também treinaram militares africanos que faziam parte das operações de paz internacionais e comumente fornecem serviços para as operações de paz do Haiti a Darfur.
O Departamento de Estado dos EUA emprega várias PMC´S para dar apoio em zonas de perigo que seriam difíceis para as forças convencionais.
PMC´s forneceram suporte às bases militares dos EUA em todo Golfo Pérsico, de refeitórios a até mesmo garantir a segurança operacional destas bases, elas forneceram guardas armados na base do exército dos EUA no Qatar, usaram munição real para treinar soldados em Camp Doha no Kuwait, mantiveram uma série de sistemas vitais na invasão militar do Iraque, prestam serviços de guarda-costas para Vip’s, segurança de instalações e escolta de comboios de abastecimento Kuwait.
Em 2008, um estudo realizado pelo Escritório do Diretor da Inteligência Nacional dos EUA, mostrou que as PMC´s eram 29% da força de trabalho na inteligência dos EUA e representavam 49% do orçamento com pessoal. Mas a grande demanda das PMC´s são mesmo as grandes corporações que atuam em zona hostis, onde estas atuam em todas as esferas de segurança destas corporações, fornecendo e organizando a política de segurança de seus funcionários e instalações. Outra área de atuação é a marítima, onde são oferecidos serviços de escolta e segurança de navios cargueiros e petroleiros, como por exemplo, os navios que passam pela costa africana onde os piratas somalis atuam de forma violenta e desumana para assaltar estes navios.
As PMC´s atuam em todos os continentes, a única exceção é o Antártico, na década de 90 havia 50 militares para cada 01 agente de PMC, hoje estimasse que esta proporção seja 10 para 01.
Alguns números sobre a atuação das PMC’s ao longo do tempo e nos principais conflitos
Como Trabalhar em uma PMC
Os empreiteiros de segurança privada, como são chamados os agentes das PMC´s no mundo hoje, são selecionados por cada uma delas, que seguem seus critérios próprios de seleção.
Eles são semelhantes aos soldados mercenários em muitos aspectos e são recrutados em todo o mundo. A maioria dos contratados já tiveram carreiras militares ou em órgãos de atuação da lei, as PMC´s britânicas costumam contratar os ex-membros da SAS, Serviços Aéreos Especiais, unidade de elite do exército britânico. Não é incomum encontrar empreiteiros que foram dispensados do serviço militar, como também os que receberam medalhas de heroísmo.
Algumas tarefas que possivelmente serão exercidas por empreiteiros:
– Formação e proteção dos guardas da República Democrática do Congo, em um esforço de parar os caçadores de animais em extinção como o rinoceronte negro;
– Proporcionar segurança das instalações, treinamento das forças de segurança e planejamento de segurança para corporações globais como a BP, Exxon, Shell, IBM, GE e outras;
– Proteção de funcionários públicos de alto escalão ou dignitários públicos, como embaixadores dos EUA no Iraque ou o secretário de estado;
– Proteger instalações de petróleo no Iraque;
– Realização de combate às drogas da Colômbia;
– Trabalho de segurança embarcado em navios cargueiros e petroleiros e etc…
Os salários podem variar de acordo com a qualificação de cada um, mas geralmente são bem remunerados com salários que vão de U$ 600,00 a U$ 1.000,00 por dia, no entanto, a maioria dos contratados não recebem benefícios, ou seja, com os seus salários precisam pagar os impostos, serviços de saúde e aposentadoria.
Os níveis de perigo que os empreiteiros das PMC´s enfrentam geralmente é menor que o nível que os militares regulares em conflito têm que lidar, isso porque, os empreiteiros não realizam missões ofensivas.
O papel das PMC´s é fornecer proteção e segurança defensiva e seus agentes devem observar as regras para o chamado uso progressivo da força para se defender, defender as estruturas pelas quais são responsáveis e a seus protegidos, além de ser legítima a defesa de qualquer civil sob ameaça iminente. Volta e meia as equipes de agentes das PMC´s se encontram envolvidos em meio a combates com armas de fogo.
Em uma zona de combate ativo, a ambiguidade de ação é inevitável e isso torna a atuação das PMC´s e seus agentes controversa, ou seja, uma operação de defesa pode facilmente se tornar em uma operação ofensiva para se obter êxito. Isso traz grandes riscos a estas empresas e seus agentes.
Para se candidatar em uma PMC é necessário ser indicado ou procurar diretamente as mesmas, que na maioria das vezes exigem, além de conhecimento específico, que se fale inglês e outras línguas. Muitas mantêm meios de cadastro em seus sites na internet.
Algumas PMC´s Pelo Mundo
Na Austrália:
– Sharp End International, usa principalmente australianos e instrutores das forças especiais Neo Zelandesa;
– Unity Resources Group, baseada em Dubai, emprega veteranos das forças especiais e policiais da Austrália, EUA, Nova Zelândia e Grã-Bretanha.
Na República Dominicana:
– Northbridge Services Group, com escritórios no Reino Unido e Ucrânia, é uma das maiores PMC´s que existem.
No Peru:
– Defion Internacional, com sede em Lima, já foi contratada para treinar os agentes da Triple Canopy, Inc. e o Departamento de Estado do EUA, atua em treinamento de agentes de segurança, serviços de segurança e fornecimento de mão-de-obra, tem escritório em Dubai, Filipinas, Sri Lanka e Iraque.
No Reino Unido:
– Aegis Defense Services, com sede em Londres, atuou em várias áreas de conflito inclusive no Iraque contratada pelo Departamento de Defesa dos EUA;
– Control Risks Group, com sede em Londres, fornece segurança armada a Embaixadas e Consulados ingleses;
– Erinys International, com sede em Dubai é uma joint venture entre ingleses e sul-africanos registrada nas Ilhas Virgens Britânicas;
– International Intelligence Limited, com sede em Eastington, possui contratos especializados em segurança e inteligência.
Nos EUA:
– AirScan, com sede em Titusville, tem contrato com o Departamento de Defesa e Força Aérea dos EUA e ainda fornece serviço a outras PMC´s;
– Academi, com sede em McLean, antigamente conhecida como Blackwater;
– DynCorp, com sede em Falls Church, atua no Iraque, Afeganistão, Somália e Colômbia;
– GK Sierra, com sede em Washington, possui contratos com o Departamento de Segurança Doméstica – DHS e Departamento de Defesa dos EUA e CIA, possui escritório em Portland e escritórios de campo em vários lugares no mundo é uma empresa da Genoa-Knowlton, Inc.;
– ITT Inc., com sede em White Plains, atua no Kosovo;
– Jorge Scientific Corporation, com sede em Arlington, presta serviço de consultoria;
– KBR, com sede em Houston, era uma divisão da Halliburton;
– MPRI Inc., com sede em Alexandria, atua na área de treinamento, fabricando dispositivos e simuladores;
– MVM Inc., com sede em Vienna, Virginia, tem contrato com a CIA e NSA;
– Northrop Grumman, com sede em Falls Church, fornece sistemas de informação, serviço técnico de atualização de sistemas embarcados em veículos militares e fabricou os famosos caças F5 e F14 além dos bombardeiros Stealth B-2;
– Raytheon, com sede em Walthan, atua na área de equipamentos militares e aeroespaciais;
– Titan Corporation, com sede em San Diego, tem contrato com o Departamento de Defesa dos EUA e atua na área de comunicação sem fio, sistemas de navegação, sistemas de informação e projetos de alta tecnologia;
– Triple Canopy, Inc., com sede em Reston, atua na África do Sul, Iraque e Síria;
– Vinnell Corporation, com sede em Herndon, atua na Turquia, Arábia Saudita e Iraque.
A Aquila International, é a primeira PMC brasileira, mas tem sede em Woodbridge, Virginia, USA. Fundada em 2016, pelo General de Brigada, reformado, do Exército brasileiro Roberto Ecoto, oferece “assessoramento, treinamento e apoio operacional e logístico especializado a governos, embaixadas, organizações internacionais, organizações não governamentais e empresas multinacionais que atuam em ambientes operacionais complexos, ou seja, com real ou potencial existência de instabilidade, crise, altos índices de criminalidade, terrorismo ou conflito armado”.
A maior PMC em operação no mundo é a G4S, uma gigante com 570.000 colaboradores espalhados por mais de 90 países, ela só fica atrás do Wal-Mart, ou seja, é o segundo maior empregador privado do mundo. Seu foco é segurança bancária, presídios e aeroportos, mas atua fortemente em zonas de crise. Em 2008, tinha 9.000 empreiteiros fortemente armados atuando no Iraque, com este número de agentes protegeu cerca de 1/3 de todos os comboios de abastecimento não militares. A G4S está presente, inclusive no Brasil onde tem 20.000 funcionários.
Bem, caros amigos e leitores ficamos por aqui com a esperança de que o assunto PMC tenha sido esclarecido, ou pelos menos, que de hoje em diante não seja um mistério escabroso.
Um abraço em todos, lembrando que quem desejar obter mais informações sobre este ou outros assuntos na área de segurança, podem enviar suas questões para a redação da revista aos meus cuidados.
Vamos lembrar outra coisa importante aos operadores da segurança pública e privada, não deixem treinar, quando acharem que estão preparados treinem mais e mais, trenem até a exaustão, pois como dizia Dale Carnegie “Quanto mais suor derramado em treinamento, menos sangue será derramado em batalha”.
Pois só temos uma vida para arriscar, a nossa.
No próximo encontro vamos falar um pouco de balística, uma ciência de muitas nuances e de total importância para área de segurança onde se envolva armas de fogo.
Até lá.
Força e Honra!!!